A Philos apresenta a exposição Subverter a escuta para olhar, organizada por Ariane Oliveira que acontece no próximo dia 3 de dezembro, a partir das 17h, na Casa Bicho, no Jardim Botânico. A mostra apresenta, pela primeira vez, no Rio de Janeiro os trabalhos em fotografia, instalação, pintura e escrita acompanhados do lançamento do livro Nos caminhos da espera e do Silêncio (Editora Azulejo Arte Impressa, 202). O livro foi realizado para distribuição gratuita para professores e alunos da rede pública de ensino e instituições educacionais. Abaixo, apresentamos o verbete Escuta, assinado pela artista e pela professora e artista Claudia Vicari Zanatta, extraído do livro Escuta Juventudes: entre A & Z:

ESCUTA
Ariane Oliveira & Claudia Vicari Zanatta

Na fila de um centro de atendimento socioeducativo, um grupo de estudantes de direito foi chamado por um grupo de mães para auxiliá-las na retirada de dúvidas jurídicas dos familiares que aguardavam para visitar os adolescentes em internação provisória. A escuta se fez necessidade, mesmo que fosse para coletar os silêncios ensurdecedores que por vezes habitavam o espaço. Os ouvidos não têm pálpebras e não podem ser fechados tão facilmente quanto os olhos, estando expostos aos sons, mas nem sempre os corpos são afetados pelos sons. Na fila, dificilmente voltava-se com o mesmo corpo que se tinha ao chegar.

As intervenções na fila começaram com estudantes de direito que sentiram a necessidade de compor as idas à fila com estudantes da psicologia. Éramos do direitos e fomos nos tornando cada vez mais outros,  Coletivo Fila. A fila que deu nome ao Coletivo, não era uma fila, ou bem, era uma fila a seu modo. Mais um ajeitar-se da melhor maneira possível, com as sacolas, em bancos, alguns quebrados, outros menos, no tempo da espera. Corpos dispersos no espaço. Nós tentávamos uni-los, torná-los próximos em sua dispersão pela escuta que ia fazendo brotar raízes nas experiências das famílias.

Cartaz da exposição de Ariane Oliveira.
Cartaz da exposição de Ariane Oliveira. Fotografia realizada no Parque de la Memoria, em Buenos Aires.

Era sempre tentativa e erro, talvez mais erro do que tentativa. Levávamos um panfleto com números da defensoria pública, do serviço jurídico da universidade, do Palácio da Polícia, da ouvidoria de Direitos Humanos, para assessorar as famílias, mas também para fazer liberar as falas, para trocar um papel, uma palavra, um gesto. Às vezes funcionava, às vezes não. Às vezes o que escutávamos eram os corpos, a rejeição. Éramos convidadas(os) a habitar o mal-estar junto às famílias. A fila era composta de silêncios, que (trans)bordaram palavras, linhas, cores e imagens.

Clique para acessar o livro com recursos de acessibilidade.


O som que sai das bocas, ouvidos, narizes, o corpo todo sonoro, por vezes raivosos, por vezes angustiados, por vezes amorosos e cheios de melodias insuspeitadas, imersos em suas subversões, à procura de ouvidos, de poros outros, esse som quando encontra a possibilidade da escuta instaura, no corpo de quem o acolhe, o tempo do outro, entra pelos orifícios, ossos, barriga, reverbera na carne, tambor tenso, “nervo tenso retenso”. Os corpos implicados (amplificados) no ato da troca dos afetos que a escuta agencia são atravessados por um tempo fora do relógio, o tempo das subjetividades.  Como se (des)faz um, dois, três,
n silêncios? Como se (des)prepara uma escuta, bruta palavra, mas nem sempre?


Ariane Oliveira —Artista e pesquisadora pelo PPGAV/UDESC, trabalha com agenciamentos coletivos de afetação, através da escuta, do cuidado e da arte.
Claudia Vicari Zanatta —Artista e professora no Departamento de Artes Visuais e Programa de pós-graduação em Artes Visuais, UFRGS. Coordena o grupo de Pesquisa Poéticas da Participação.


Serviço: Abertura da exposição Subverter a escuta para olhar, de Ariane Oliveira —Casa Bicho [Rua Caio de Melo Franco 375, Jardim Botânico], dia 3 de dezembro de 2022 a partir das 17h. Ao longo da exposição serão realizadas ações de contrapartida social como saraus e oficinas abertas ao público. 


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Publicado por:Philos

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